Memórias de Guaiúba

Um dos principais objetivos desse blog é colocar os fiéis católicos guaiubanos em contato direto com um projeto de paróquia missionária, ou seja, uma proposta de evangelização moldada nos princípios que conduzem o real sentido da fé cristã que é a escuta audaz da palavra de Deus, anunciação viva que alimenta nossa nossa existência e a formação de pequenas comunidades cristãs. De acordo com alguns relatos históricos o município de Guaiúba sempre se mostrou fervoroso diante das ações evangelizadoras desenvolvidas pela igreja e isso ficou registrado através da história oral e de algumas fotografias. Reservaremos nesse blog um espaço para a exposição de algumas dessas fotografias antigas (Memórias de Guaiúba), sendo que a apresentação das mesmas obedecerá a uma ordem cronológica seguida de um breve comentário. Será responsável por esse espaço o professor e memorialista Antônio Carlos Sales Paiva.

A MEMÓRIA VIVA DOS GUAIUBANOS ESTAMPADAS EM DOIS ÁLBUNS DE FOTOGRAFIAS

Durante algum tempo, os guaiubanos encontravam-se fragilizados e tristes com o sumiço de um dos arquivos históricos mais importantes da Paróquia de Guaiúba – um álbum de fotografias organizado na época em que Padre Gerardo José Campos estava a frente da paróquia e que demonstrava o esplendor de uma época áurea para o município de Guaiúba, na época distrito do município de Pacatuba.
Para alguns jornalistas da época, Padre Gerardo era descrito como “um moço, de feições finas e dando a impressão de estarmos frente a frente com um desses simpáticos atores de cinema, interpretando o papel de um sacerdote. Dificilmente se pode acreditar que é um homem do trabalho árduo. Se parte do seu dia é tomada com ensinamentos de crianças e jovens, com assistência espiritual dos seus paroquianos, parte é também dedicada as obras de construção, seja abrindo uma estrada, supervisionando a construção de um prédio, ou algo mais pesado. Ele é realmente magnífico e quando se elogia diz que nada fez, que nada faria sem a ajuda de seu povo”[1].
Para Rubem Alves[2], um álbum de fotografia nada mais é do que “um arquivo paralisado de felicidades perdidas que retornam quando de novo os vemos”. E era assim que se sentiam as pessoas que tinham acesso a esse material: felizes, radiantes, emocionadas. E muitos até sonhavam em fazer parte daquele tempo, que porventura não voltará jamais.
As imagens ali contidas, que na visão de Eduardo França[3] “é uma espécie de ponte entre a realidade retratada e outras realidades, e outros assuntos, seja no passado, seja no presente. E por isso ela não se esgota em si” - representavam cenas do cotidiano dos guaiubanos: moças sentadas na praça do cruzeiro, mulheres e jovens envolvidos em atividades religiosas, a presença das irmãs filhas do amor divino (que ajudavam a administrar o Patronato da Divina Providência), os desfiles cívicos de 7 de setembro, o lactário, os japoneses representativos da colônia que se estabeleceu no núcleo colonial Pio XII no dia 16 de maio de 1960 (destacando
aqui o fato de que esses eram os primeiros nipônicos que chegavam ao estado do Ceará); as comemorações do dia do trabalho, as crianças da catequese com suas catequistas, a construção da praça que embelezava o Patronato, as apresentações artísticas que ocorriam no salão paroquial, as festividades estudantis realizadas pelos alunos do Patronato, a primeira turma de alunos que realizaram o famoso Exame de Admissão para o Ginásio, o pastoril, a inauguração e benção do Patronato da Divina Providência, a inauguração do Patronato São Francisco, em Água Verde, dentre tantas, ajudavam a formar nosso imaginário histórico e comprovavam quão especial era aquele tempo, que até então as pessoas mencionam com um certo saudosismo e com um rosto preenchido pela saudade.
Quando ousamos em utilizar o termo “época áurea” fazemos alusão a um período em que a Igreja Católica comandava todos os rumos de um simples distrito com fóruns de município. Uma época em que os guaiubanos conheceram o apogeu do desenvolvimento do lugar emblematizado pelos serviços prestados pela igreja àquela população carente com recursos oriundos dos católicos da cidade de Colônia na Alemanha e da ação social, rural, paroquial de Guaiúba criada oficialmente em 26 de fevereiro de 1957, além do apoio inestimável de Moema Távora, irmã do ex Governador Virgílio Távora, de quem Padre Gerardo tinha muito prestígio.
Todas essas ações encontram-se bem vivas na memória daqueles que fizeram parte dessa época, muitos ainda vivos como Neguinha, Toto, Raimunda Paiva, Sinval Leitão, Elsa Lima, Margarida Cavalcante, Paulo Rossi, Wilson Fontoura, João Rodrigues, Carmosita, Mosinha, Dona Expedita, Terezinha Assunção, Júlia Araújo e tantos outros que apresentam seus rostos bem configurados em muitas das fotografias contidas nesse vivo memorial histórico e são testemunhas vivas das transformações sofridas por Guaiúba ao longo do tempo.
Entendemos também a preocupação do jovem Pároco, em deixar registrado para a posteridade os grandes feitos por ele idealizados e postos em prática com a ajuda da comunidade católica guaiubana. É importante mencionar que na época as fotografias eram de difícil produção e de difícil acesso, pois dependiam de equipamentos e materiais caros. No entanto, hoje assumem papel comum na sociedade moderna, todos têm suas próprias câmeras e produzem suas próprias fotos, as quais podem ser modificadas, ampliadas e enquadradas da forma que melhor convir aos desejos do fotografo.
Confesso que fiquei emocionado, quando encontrei Padre Emílio César no último domingo na Capela de Santo Antonio, quando no momento em que me dirigi a ele para cumprimentá-lo recebi a feliz notícia de que os álbuns haviam sido resgatados e que já se encontravam nas dependências da paróquia. Guaiúba está de parabéns, por ter ainda documentos valiosos que comprovam sua tão esquecida história.
Antônio Carlos Sales Paiva

[1] FROTA, José Ferreira. Magnifico Jornal Gazeta do Ceará, Fortaleza, CE, p. 11 , 13 set. 1961.
[2] ALVES, Rubem. A alegria de ensinar. Campinas, SP. Papirus. 2000, p. 72.
[3] PAIVA, Eduardo França. História e imagens. Belo Horizonte. Autentica 2002, p. 19.



O CRUZEIRO DA MATRIZ



A cruz para os cristão é símbolo de imensa fé e vitória, pois foi através desse madeiro que Jesus provou para a humanidade sua real obediência ao pai e seu total desprendimento das coisas proporcionadas por esse mundo. A cruz é também sinal de respeito, de lembrança constante daquele que veio ao mundo para espalhar sementes de amor, de caridade, de alegria e que viveu intensamente fazendo as vontades de seu pai, fazendo os seres humanos enxergar que todos teriam a oportunidade de viverem em um dia num paraíso, mas para terem essa dádiva deveriam caminhar conforme seus ensinamentos. Conhecedores dessa verdade, os católicos guaiubanos que iniciaram sua devoção a Sagrada Família em meados do século XVIII, logo após a construção da primeira capela da cidade, afincaram a frente do pequeno templo uma cruz de madeira de lei oriunda da serra da Aratanha. Segundo o Padre José Edilson Campos[1] o responsável pela fixação do cruzeiro da matriz no local onde se destaca até os dias atuais foi o Senhor Custódio Teixeira Gonçalves, proprietário do Sítio Corte (local onde se localiza o conhecido açude da serra), o mesmo tirou o pau para o cruzeiro do Sítio Alpes, do Senhor João Mendes. Juntou oitenta homens que transportaram o pau para Guaiúba em noite de lua, com o Sr. Custódio montado em cima, o povo dando vivas ao Sr. Custódio e Custódio dando vivas a
Jesus, Maria e José. O antigo cruzeiro fora trocado pelo atual no paroquiato de Padre Vicente Moraes dos Santos, que teve a frente da campanha para a sua aquisição o grupo Apostolado da Oração. O cruzeiro atual não demonstra tanta nostalgia como o antigo. É um aparato mais suntuoso, porém veio apagar um pouco das memórias dos guaiubanos que vivenciaram diversos aspectos de sua história tendo como palco a Igreja Matriz e seu patamar, resplandecentes com aquele belo símbolo que unido a paisagem pitoresca do lugar nos fazia refletir acerca de nossas ações cotidianas, além de nos prender um pouco ao nosso passado. A próxima foto e comentário que será divulgado fará referência a Imagem da Sagrada Família existente na Igreja Matriz.
Antônio Carlos Sales Paiva

[1] Pe. Dr. José Edilson Campos e Silva, nasceu a 11 de julho de 1915, na cidade de Pacatuba-CE, filho de João de Deus e Silva e de Jesudina Campos e Silva. Ordenou-se em Roma à 27 de novembro de 1938. Paroquiou Pedra Branca, Itapipoca, Cascavel e Pacatuba. Nomeado em 30 de janeiro de 1954, Capelão da Polícia Militar do Ceará, por ato do Exmo. Sr. Governador do Estado Stênio Gomes da Silva (1954-1956). Foi Professor da Faculdade de Filosofia do Ceará. Esses fatos foram descritos por Padre Edilson em uma seção do Jornal Correio do Ceará intitulada de crônicas pacatubanas.


IGREJA MATRIZ DE GUAIÚBA NO ANO DE 1932
No decorrer dos anos os moradores de Guaiúba deram prova de devoção ao cristianismo, sobretudo nos momentos de aflição como os vividos nas secas de 1825 e 1845.
O sofrimento provocado pelas secas e por pestes que afligiam o Ceará, sensibilizou moradores e proprietários do lugar para a construção de uma Capela.
Em meados do século XIX, Domingos da Costa e Silva – o Domingão – sitiante em Guaiúba e possuidor do Engenho Rio Formoso na referida cidade, erguia uma pequena ermida de palha assentando a frente uma cruz de madeira. A Capela foi descrita pelo cientista Freire Alemão em visita a Guaiúba no ano de 1859 como sendo uma “pobre igreja sem aparência de templo, numa meia laranja, com praça em frente, guarnecida pelos dois lados e mais baixo que a igreja, por casas térreas e pobres”.
Em 1885 André Accioly de Vasconcelos, João Facundo de Menezes e Constantino da Costa e Silva resolveram construir a atual Matriz de Guaiúba. A nova capela ficou ainda por muito tempo incompleta, mas em 1898, nas Missões de Frei Davi de Milão, o povo de Guaiúba concluiu a igreja.
Essa fotografia apresenta a igreja no ano de 1932 e vê-se claramente que sua edificação foi realizada numa das partes mais altas da cidade, evidenciando talvez o fato de ser a Capela um espaço de fervor e destaque em meio a outros prédios públicos construídos na mesma época, como a Estação da Estrada de Ferro. Consta também nos altos de nossa história que o município começou a organizar toda sua área urbana em torno da Igreja Matriz e que com a construção e inauguração da Estação Ferroviária Guaiúba passou a ser habitada em novo espaço, dessa vez em torno desse novo prédio.
A próxima foto que será divulgada colocará em evidência o antigo cruzeiro da Igreja Matriz e aspectos que colaboraram para sua fixação naquele local.


HISTÓRICO DA PARÓQUIA DE GUAIÚBA[1]

A historia cidade religiosa emGuaiúba é a mesma da tradição brasileira desde seus primórdios. Todos os cidadãos de Guaiúba têm a religiosidade presente em suas vidas, seja pelos ensinamentos de seus ancestrais, seja pela importância que a cidade representa para a fé católica.
Para se conhecer as bases históricas de qualquer parte do território brasileiro, devemos ter em mente um refrão histórico: “O BRASIL, NASCEU AOS PÉS DA CRUZ”. Partindo de tal princípio, podemos então avaliar que Guaiúba não fugiu a regra. A cidade nasceu em 08 de setembro de 1682, como se pode verificar em um documento conhecido como “DATTA DE SESMARIAS”. Este documento validava a doação de terras, por parte do governo português, a donatários, que deveriam colonizar e desenvolver o lote doado.
Guaiúba nasceu primeiramente sob a denominação de Gayba pelos Tamoios, seus primeiros habitantes. Esta denominação foi mais tarde traduzida pelo ilustre escritor cearense, José de Alencar, como “POR ONDE CORREM AS ÁGUAS DO VALE”.
Contudo, a história guaiubana não começa exatamente após a doação das terras. Guaiúba apresenta um vazio histórico de aproximadamente cem anos. Somente a partir de 1775, é que se tem notícia dos primeiros ocupantes da região onde hoje estão localizados os municípios de Pacatuba e Guaiúba. Estabeleceu-se, nestas localidades, a família Costa e Silva.
A partir da vinda desta família, a vida espiritual da referida localidade começa a ganhar forma. Coube a Domingos da Costa e Silva, construir o primeiro estabelecimento espiritual em Guaiúba. Tal iniciativa foi decisiva para a concretização de um sonho: a construção da Igreja Matriz Jesus, Maria eJosé.
Após a morte de Domingão, como Domingos da Costa e Silva era conhecido, outros personagens da história guaiubana se tornaram responsáveis pela construção da igreja. Foram eles: Custódio Teixeira Lima, André Accioly e outros da referida família, Constantino da Costa e Silva possivelmente filho de Domingos da Costa e Silva, a família Frederico Araújo, além do apoio do Sr. João Correia Mendes, português que, durante muitos anos, foi uma importante liderança no município.
Finalmente , em 1899, a Igreja Matriz de Guaiúba foi concluída e inaugurada, desde já ostentando seu estilo Gótico. Por volta do ano de 1930, chegam a cidade missionários de outras localidades, iniciando as Santas Missões.

Com o estabelecimento das missões, a cidade começou a se desenvolver. Guaiúba passou a ser conhecida pelos arredores, através do “Terço das Segundas”, ministrado e liderado pela Srª Antonia Araújo de Freitas (Dona Totônia), esposa do Srº Manuel Baltazar, um dos maiores defensores do paroquiato de Guaiúba; pelas festas na pracinha do santo cruzeiro construída pelo Sr. Lindolfo Accioly; pelas romarias e novenas e por fim, pela Capela do Santo Cruzeiro construída em 1939 e inaugurada em 1940.
Logo, os moradores da cidade perceberam a necessidade da criação de uma paróquia para atender a população local. Até então, entre os anos de 1940/50, os serviços religiosos eram prestados pela Paróquia de Pacatuba, que enviava vigários como José Gaspar, Pe Rolim e Padre Antonio Souto, sendo este último uma grande expressão no âmbito da expansão religiosa.
Almejando a criação de um Sistema Paroquial em Guaiúba, as lideranças locais, como Manoel Baltazar, Raimundo Bandeira, Sinval Soares, José Nocrato, José Tristão, Clóvis Teixeira, Waldemar Teixeira, Lindolfo Accioly, Esaú Accioly e Francisco Gonçalves Ferreira (seu Nenê), organizaram uma comissão para formalizar o pedido de criação do já citado sistema pertencente a Arquidiocese de Fortaleza.
Após a formalização do pedido, todos os cidadãos guaiubanos iniciaram uma campanha para arrecadar fundos em prol da futura paróquia. Este movimento teve como líder político Joaquim Eduardo Benevides e, quanto à parte financeira, teve como principal representante o Sr. Manuel Baltazar de Freitas. Este último recebeu, posteriormente, o título de "Pai da Paróquia" pela sua significante contribuição financeira e empenho na criação da Paróquia de Guaiúba.

Concluída a arrecadação do montante exigido pela Arquidiocese de Fortaleza, a população guaiubana tem seu sonho realizado. No dia 19 de março de 1955, chega a cidade o primeiro pároco: Pe. Gerardo José Campos. Paulo Cabral de Araújo (orador e radialista) e Manuel Eduardo Campos (escritor, poeta, dramaturgo, radialista e presidente da Academia Cearense de Letras) ficaram responsáveis pelas saudações ao jovem e primeiro vigário.
Com a criação efetiva do paroquiato, o município conheceu um notável crescimento, com inúmeras ações no campo religioso, social e educacional, que beneficiaram de forma incontestável a vida da comunidade local. Algumas das principais ações foram: criação da Ação Social Paroquial de Guaiúba, a implantação do Programa Guaiúba se Diverte, cujo objetivo era o estímulo e a descoberta de talentos artísticos da terra e a apresentação de artistas consagrados nacionalmente; o Centro Catequético; a preservação da cultura e do folclore local, traduzidas pela intensa mobilização dos paroquianos nas festas religiosas; a participação popular nas ações políticas, traduzidas pelas passeatas nas datas mais importantes do ano, entre elas o 1º de maio; a criação do Patronato da Divina Providência, transformado depois em Ginásio Manuel Baltazar, entendido como o feito de maior expressão na Paróquia de Guaiúba.

Após 56 anos de Paróquia, os guaiubanos atestam que o legado do Padre Gerardo Campos, foi o marco divisor de duas Guaiubas: uma antes do Padre Gerardo e outra após o Padre Gerardo. Nenhum outro vigário teve uma obra missionária, social e educacional tão completa, e com resultados tão proeminentes e relevantes quanto o nosso primeiro vigário.
Cabe ainda ressaltar que o patrimônio paroquial foi enriquecido através de doações da parte da Sra. Amélia Araújo Pinheiro, viúva do Sr. Lindolfo Accioly, como a Casa e o Salão Paroquial, e o terreno onde foi construída a Maternidade Amélia Araújo Pinheiro, atualmente, sede de um posto médico e da Associação de Pais de Crianças Especiais APPAE.
Analisando toda a história de lutas e sonhos realizados, não nos resta dúvidas de que a criação da Paróquia de Guaiúba foi um dos maiores acontecimentos históricos da cidade. Juntamente com a sua criação veio o desenvolvimento social, fazendo de Guaiúba uma cidade realmente abençoada, e demonstrando, assim, que tem um povo que não esmorece diante do primeiro obstáculo.

[1] Esse texto foi escrito pelo Professor Sinval Leitão Filho, sendo que o mesmo está sendo postado neste Blog sob a responsabilidade do Professor Antônio Carlos Sales Paiva autorizado pela filha do escritor a Prof.ª Dr.ª Fátima Maria Leitão Araújo.