“Tua fé te salvou”
(Lc 17, 19).
Mais uma vez o evangelho nos leva a refletir sobre a fé.
Esse é um tema muito importante para o cristão, que precisa continuamente
confrontar aquilo que é fundamental no ensinamento de Jesus com aquilo que
provém da sua religiosidade natural.
“Eu não recebi a graça que pedi porque talvez eu não
mereci”. Esta frase, com pequenas variantes, ouvi algumas vezes de pessoas mais
idosas e simples que não têm medo de falar o que vem à sua cabeça. Ela reflete,
provavelmente, uma prática religiosa alicerçada no mérito, na prática da lei.
Se cumprir tudo aquilo que Deus me pede eu poderei pedir coisas para Ele e Ele
me dará, porque “eu mereço”. Se Ele não me der, eu me revolto.

Na primeira leitura, nós lemos a segunda parte da história
de Naamã, o Sírio. Ao se lavar nas águas do Jordão, indo contra seu orgulho – que
esperava do profeta ações à altura de um alto funcionário do rei Aram (cf. 2Rs
5,1.11) –, fica totalmente curado (cf. 2Rs 5,14). Espantado, ele retorna a
Elizeu, manifesta a sua conversão ao Deus de Israel e oferece presente ao
profeta (cf. 2Rs 5,15). Colocada como primeira leitura deste domingo, a
passagem pode ser lida como uma tentativa de pagar a cura recebida, por isso o
homem de Deus rejeita decididamente o gesto de Naamã.
Retornando à questão da fé e da religiosidade, percebemos
que o nosso povo tem um costume arraigado de realizar promessas a Deus ou a um
santo. “Se você me der isso eu lhe dou aquilo”. Quando se recebe a cura ou a
graça pleiteada, é hora de “pagá-la”, cumprindo aquilo que foi prometido: ir a
pé para Canindé, vestir roupa branca por tantos anos, atravessar a igreja de
joelhos... Será que Deus se alegra com isso ou tais atos são muito mais reflexo
de uma religiosidade natural do homem e da mulher?[1]
Deus prefere que a pessoa agraciada tenha um coração cheio de reconhecimento
Àquele que é bom e derrama dádivas sobre os seus, gratuitamente.
É difícil nos sentirmos devedores; achamos que nosso credor
algum dia vai nos cobrar de maneira cruel. Mas na relação com Deus isso não
acontece. Somos devedores, pois Ele nos deu a vida, o perdão, tantas graças...
a única coisa que ele cobra, porém, é que reconheçamos essa realidade e vivamos
de cabeça erguida: “Levanta-te e vai! Tua
fé te salvou.”(Lc 17,19).
Pe. Emilio Cesar
Pároco
de Guaiuba
[1] A religiosidade popular é acolhida pela Igreja como
próprio da psicologia e da cultura do nosso povo, mas ela percebe que precisa
anunciar o evangelho de Jesus para essas pessoas e ajudá-las a passar a uma fé
mais centrada no Cristo e na Igreja (comunidade de cristãos).
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