As leituras de hoje falam de um tema fundamental para o cristão:
a fé. Alguns pensam que acreditar é saber que Deus existe, outros acham que têm
fé porque seus pedidos são atendidos; existem ainda aqueles que confundem
acreditar com sentir – por isso vivem de “missa de cura e libertação”. Os
bispos da América Latina e do Caribe, reunidos em Aparecida, nos ensinaram que fé
é um dom de Deus e uma resposta do ser humano que nasce a partir do encontro da
pessoa com Jesus Cristo. Esse encontro dá um novo horizonte à vida e, com isso,
uma orientação decisiva (cf. D.A. 12).
Na primeira leitura, Habacuc nos diz: “Quem não é correto
vai morrer, mas o justo viverá por sua fé” (2,4). O profeta estava afirmando
que o homem que vivia segundo a vontade do Senhor expressa na Lei (o homem
fiel), ou seja, os habitantes de Judá, se salvariam do grande perigo dos
invasores caldeus; estes, por sua vez, iriam sucumbir graças à ação divina.
S. Paulo utiliza a segunda parte da afirmação Habacuc, “o
justo viverá por sua fé” (Rm 1,16; Gal 3,11), e lhe dá um significado mais
profundo. Crer significa confiar inteiramente naquele que se entregou
livremente à morte por nossos pecados e ressuscitou para nos perdoar e dar uma
vida nova (cf. Rm 5,25). O homem e a mulher são pecadores, mas se tornam justos
(perdoados) pela fé em Jesus Cristo. Assim podem viver de uma maneira nova,
viver no Espírito (Rm 8), viver no amor (Gal 5,6). A fé, a partir das palavras
desse grande apóstolo, não é, em primeiro lugar, fidelidade, mas confiança
total no Deus que se manifesta em Jesus Cristo, especialmente através da sua
morte e ressurreição. Tal confiança leva a uma mudança contínua de vida, à
fidelidade às palavras daquele que nos amou e se entregou por nós.
No evangelho, os apóstolos pedem a Jesus: “Aumenta a nossa
fé”. Eles começaram a perceber que sem uma confiança total em Jesus eles nunca
poderiam ser verdadeiros discípulos, muito menos missionários. Há pouco Jesus
tinha falado da correção fraterna, dos escândalos (Lc 17,1-4) e da
pobreza/riqueza (Evangelho do domingo anterior, Lc 16, 19-31). Como viver tudo
isso sem acreditar na pessoa dele? De fato, Jesus vai afirmar que quem tem fé,
por menor que seja, poderá fazer grandes milagres. O autor da 1a
carta de João vai dizer: “E esta é a vitória que venceu o mundo: a nossa fé”
(1Jo 5,4). Na primeira comunidade cristã de Jerusalém, a fé em Jesus levou os
cristãos a partilharem a vida em comunidade ao ponto de venderem suas
propriedades para que não houvesse no meio deles sequer um necessitado (At
2,42-47). Esta comunhão de vida não acontece graças a um ideal sociológico ou
político, mas à fé, porque para que isso aconteça é preciso vencer o egoísmo (o
mundo) que existe em cada um. Esta fé, que se faz operante através da caridade,
é o maior milagre que pode acontecer sobre a face da terra. Por isso o autor
dos Atos dos Apóstolos sempre apresentava como característica da primeira comunidade
cristã os milagres juntamente com a partilha (cf. At 2,42-47; 4,32-35;
5,12-16). Foi esta confiança em Jesus vivida na comunidade que conseguiu vencer
a idolatria do Império Romano, com todas as suas injustiças, sem precisar, para
isso, de violência. Existe milagre maior que esse!?
“Senhor, aumenta a nossa fé”, é a oração que queremos fazer
hoje como indivíduo e como comunidade cristã. Alguns dos que estão aqui ainda
não sabem o que significa crer dessa forma. Participam da missa quando têm
vontade ou mesmo todos os domingos, mas ainda não tiveram um encontro pessoal
com Jesus que provoca uma adesão, uma entrega confiante a Ele. Outros já
começaram a entender a diferença entre crer e praticar a religião por medo, hábito
ou interesse, mas ainda não tiveram coragem de dar o segundo passo da fé, que é
viver em comunidade. Sim, para eu conhecer verdadeiramente quem é Jesus,
preciso ouvir o anúncio que a Igreja faz todo domingo na sua celebração.
Preciso também participar de grupos eclesiais onde posso aprofundar minha
confiança pela oração, estudo da Palavra e vida fraterna. Somente através
destes meios posso ter uma fé autêntica, profunda, e não fruto apenas dos meus
sentimentos, interesses ou medos. Se tivermos fé ao menos do tamanho de um grão
de mostarda poderemos realizar grandes milagres: reconciliar inimigos, fazer
com que não haja necessitados em nossa comunidade, diminuir a injustiça da
nossa cidade... vencer o mundo que existe dentro e fora de nós.
Pe. Emilio Cesar
Pároco de Guaiúba
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