“Deus não é um Deus dos mortos, mas dos vivos” (Lc 20, 38).
O evangelho de hoje fala da ressurreição dos mortos, um tema
polêmico na época de Jesus e ainda hoje. Alguns saduceus se aproximaram do
Mestre para ridicularizar sua crença na ressurreição com uma história criada a
partir da lei do levirato[1]. Essa
norma dizia que se um homem se casasse com uma mulher e morresse antes de
deixar um filho, seu irmão deveria tomá-la como esposa e o primeiro filho que
tivesse seria considerado do falecido (cf. Dt 25,5-10; Gn 38,8). Isso
garantiria a descendência e que suas propriedades continuariam na família. Se
esta situação tivesse acontecido entre uma mulher e sete irmãos, na
ressurreição ela seria esposa de quem? Perguntou um saduceu.
O grupo dos saduceus só aceitavam a Lei escrita (primeiros
cinco livros da Bíblia), eram ligados às famílias sacerdotais e ao templo de
Jerusalém e não aceitavam a ressurreição dos mortos, por isso queriam caçoar de
Jesus. A história que eles contam mostra uma ideia muito materialista da
ressurreição, como se essa fosse um retorno à vida terrena, ou como se a
realidade futura se regesse segundo nossas leis: procriação, envelhecimento,
morte etc.
Jesus fala claramente que a ressureição deve ser pensada de
uma maneira nova: “são iguais aos anjos, serão filhos de Deus” (Lc 20,36). Uma
vez um fiel me procurou dando uma interpretação muito estranha dessa passagem.
Alguém tinha lhe ensinado, e ele passava a ideia adiante, que na vida futura
nós não iríamos mais conhecer quem foi nossa mãe, pai, irmãos, esposa,
esposo... Tudo seria apagado da nossa memória e seríamos anjos[2].
Nada mais errado para a nossa fé. É verdade que não estaremos mais sob a lei do
envelhecimento, nem do espaço, ou do tempo; veremos Deus face a face, o que nos
dará uma alegria inefável. Mas a nossa memória não se apagará, a nossa história
será transfigurada juntamente conosco e reconheceremos todos aqueles com quem
nos relacionamos sobre a terra, isso será um acréscimo na alegria experimentada
no céu. Fico imaginando como será grande a alegria de uma mãe ao reencontrar
seu filho na glória celeste.
Toda missa dominical nós rezamos: “Creio na ressurreição da
carne”. O que isso significa?
A Igreja Católica acredita que da mesma forma que Cristo
ressuscitou dos mortos, e vive para sempre, assim também, depois da morte, os
justos viverão para sempre com Cristo ressuscitado e que Ele os ressuscitará no
último dia (cf. Rm 8,11). Dizer “creio na ressurreição da carne", é
acreditar que após a morte não haverá somente a vida da alma imortal, mas que
mesmo os nossos "corpos mortais" (Rm 8,11) readquirirão vida[3].
Alguns que me escutam podem estar pensando, essa é minha
única esperança. Quando morrer vou parar de sofrer e começar a ser feliz. Um
dos segredos da fé cristã é que essa ressurreição inicia já aqui na terra. O
evangelho já dizia, “Deus não é Deus dos mortos, mas dos vivos” (Lc 20,37), não só para quem já morreu
(Abraão, Isaac e Jacó) mas também para quem está vivo.
A bem-aventurança da ressurreição começa aqui na terra!
Quando alguém ouve as palavras de Jesus e crê nele passa da morte para a vida
(Jo 5,24), deixa de viver uma vida sem rumo certo, medíocre, morta, e começa a
viver plenamente; porque vive com o Senhor e ele é a Vida (cf. Jo 11,25-26; At
3,15; 5,20).
Crer não é apenas dizer: “Eu creio”, mas é confiar naquele
que morreu e ressuscitou para nos salvar e viver a partir desse princípio em
uma comunidade cristã. A vida de muitos
que estão hoje aqui não é nada fácil. Existem dificuldades na família, no
trabalho, nas amizades... sinais de morte. Quem acredita realmente em Jesus
assume duas atitudes fundamentais: 1) deixa de lado tudo aquilo que leva à
morte e pode afastar da Vida (a mentira, o roubo, o adultério, a violência, as
superstições...); 2) leva Deus para aquelas situações de morte com o objetivo
de transformá-las em instrumento de ressurreição e vida (pobreza, dificuldade
com o marido, vizinha ou filhos, falta de emprego etc). Essa é a experiência
que muitas pessoas que fazem parte dos grupos de catequese de adultos têm
experimentado e testemunhado.
Na missa de hoje desejo convidá-lo mais uma vez a fazer essa
experiência de ressurreição que muitos já fizeram. Aproxime-se mais da sua
Igreja através de um grupo de catequese de adultos, ou um movimento, e viva
essa aventura da fé.
Pe. Emilio Cesar
Pároco de Guaiuba
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