sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

VI DOMINGO DO TEMPO COMUM

TEMPO COMUM
VI DOMINGO

Lv 13,1-2.44-46
1Cor 10,31-11,1
Mc 1,40-45

Eu quero, fica curado” (Mc 1,41)

Domingo passado ouvimos uma leitura que falava da miséria da condição humana. O lamento de Jó escandaliza os corações mais otimistas e esperançosos. A primeira leitura de hoje mostra o tratamento inumano que uma pessoa atingida pelo mal da lepra recebia da sociedade da época: declarado impuro pelo sacerdote devia vestir-se de roupas rasgadas, usar cabelos assanhados e sair gritando “impuro”; devia deixar seu lar e morar fora das cidades (cf. Lv 13,44-46). Se um leproso da época escrevesse seu lamento talvez não teríamos coragem de lê-lo.
Hoje esta doença é chamada de hanseníase e sua maior concentração está no Brasil e na Índia. Noventa por cento da doença na América Latina se encontra no nosso país! Ela é causada por uma bactéria (Mycobacterium leprae) que se transmite por via oral caso o enfermo não esteja se tratando. Sim, ela tem cura e seu tratamento é gratuito. Por isso, as condições de um leproso hoje é bem diferente. Eles não precisam deixar suas famílias e ser excluídos da sociedade. Infelizmente a desinformação faz que muitas pessoas se contaminem ou não se tratem[1].
Voltemos ao contexto bíblico. O motivo de tanta severidade em relação a estes enfermos é devido a santidade de Deus. Seu elemento essencial é a pureza externa e ritual. O leproso era impuro porque estava se decompondo, era considerado um morto que não podia se aproximar do Deus da vida. Muitas vezes esta doença era vista como a manifestação externa do pecado da pessoa: um atentado à virtude vivificante do Deus de Israel[2].
Na narrativa evangélica percebemos que o leproso descumpriu várias leis: não se manteve a distância, não gritou “impuro”... pelo contrário, se aproximou de Jesus e de joelhos lhe pediu: “Se queres, tens o poder de curar-me” (Mc 1,40). As contravenções da lei não param por ai. O Senhor, movido de compaixão, estende a mão, toca nele e diz: “Eu quero, fica curado” (Mc 1,41). As leis rituais são superadas pela misericórdia e esta cura ajuda a reconhecer quem é Jesus: o Messias poderoso (cf. Mt 11,5).
O “se queres” do doente indica o reconhecimento de uma vontade tão forte quanto a de Deus no Antigo Testamento[3]. Ela pode curá-lo! Jesus confirma essa ideia quando diz: “Eu quero, fica curado”! Se acrescentamos a isso o gesto de estender a mão que era próprio de Deus e de Moisés quando cumpria um prodígio (cf. Ex 4,4; 7,19; 8,1; 9,22s; 14,16); o toque; a dificuldade de acontecer a cura de lepra, ao ponto de ser comparada a uma ressurreição pelos mestres antigos[4]... vamos entender a grandiosidade desse milagre. O enfermo com sua súplica reconhece o poder divino de Jesus. O Mestre age não só como um profeta poderoso dos últimos tempos mas como o Senhor Deus.
Agora podemos descobrir o que esta passagem bíblica nos diz hoje. Nós somos, ou deveríamos ser, aquele leproso que grita: “Se queres, tens o poder de curar-me” (Mc 1,40). Estamos mortalmente enfermos, a lepra envolve todo o nosso ser e nos consome. Ela se chama pecado. Apesar de existirem muitos leprosos naquela época apenas um teve coragem de sair do seu anonimato e ir ao encontro de Jesus suplicar a cura. Pecadores todos nós somos, mas poucos são aqueles que dão o primeiro passo para a cura: reconhecer-se necessitado da misericórdia do Senhor. Sair do seu cômodo esconderijo e colocar-se aos olhos de todos como leproso e de joelhos suplicar: “Se queres, tens o poder de perdoar-me”. Isso acontece no início de cada celebração eucarística quando batemos no peito e dizemos “pequei muitas vezes, por minha culpa, minha tão grande culpa”; ou quando nos aproximamos do sacramento da confissão e contamos o nosso pecado para um homem também pecador que estendendo as mãos sobre nossa cabeça diz: “Eu quero, sê perdoado”. Ou com as palavras da Igreja: “Eu te perdoo de todos os teus pecados. Em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo”. Somos, assim, curados da nossa lepra!



Pe. Emilio Cesar
Pároco de Messejana


[1] Seus principais sinais e sintomas são: sensação de formigamento, fisgadas ou dormência nas extremidades; manchas brancas ou avermelhadas, geralmente com perda da sensibilidade ao calor, frio, dor e ao toque; áreas da pele que apresentem alteração da sensibilidade e da secreção de suor; caroços e placas em qualquer região do corpo e diminuição da força muscular (dificuldade para segurar objetos) (http://www.todabiologia.com/doencas/hanseniase.htm, acesso em 12/fev/2015).
[2] Cf. Lv 13,1, nota a (A Bíblia de Jerusalém. Nova edição rev. e ampl. São Paulo: Paulus, 2002); Raniero Cantalamessa, La Parola e la vita. Riflessioni sulla Parola di Dio delle Domeniche e delle feste dell’anno B. 9a Ed., Roma: Città Nuova 2001, p. 193.
[3] Cf. Sl 115,3; Eclo 8,3; Jó 10,13; 42,2; Is 55,11 etc. (cf. R. Pesch, Il vangelo di Marco, I. Brescia: Paideia, 1980, p. 241s).
[4] Cf. R. Pesch, Il vangelo di Marco, I. Brescia: Paideia, 1980, p. 242.

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