“Não podeis servir a Deus e ao dinheiro” (Lc 16,9).
O evangelho apresentado na liturgia de hoje é um daqueles
que nos faz deparar com toda nossa incapacidade e pode nos fazer pensar que a
mensagem de Jesus é impraticável nos dias de hoje. Somente alguns poucos,
aqueles que renunciam a todos os bens para segui-lo, poderiam cumprir a risca
essa e outras passagens do evangelho.
Outra dificuldade é entender como Jesus elogia a esperteza
desse administrador que, na iminência de ser despedido, altera as contas do seu
patrão em vista de seu próprio benefício. Na verdade, o administrador daquela
época tinha o direito de conceder empréstimos com os bens de seu patrão. Como
não era remunerado, ele aumentava o valor do empréstimo no recibo para na hora
do reembolso ficar com a diferença. Podemos deduzir pelo contexto da parábola e
o elogio do Senhor (Lc 1,8), que o empréstimo tinha sido de cinquenta barris de
óleo e oitenta medidas de trigo, o que o administrador retirou era sua parte na
negociação. Sua desonestidade não consistiu na alteração dos recibos (ele não
estava prejudicando o patrão mas renunciando ao seu “lucro”) mas em alguma
transação desonesta acontecida antes (cf. Lc 16,1)[1].
Jesus louvou o administrador porque diante de uma situação
de emergência agiu com esperteza[2]:
“Com efeito, os filhos deste mundo são mais espertos em seus negócios do que os
filhos da luz” (Lc 16,8). Às vezes pensamos que ser cristão é ser ingênuo, mas
Jesus ensina justamente o contrário. O cristão precisa usar a sua inteligência
para as coisas de Deus, ser esperto no anúncio da boa nova, na implantação do
Reino, na administração dos bens. Se ele não tira proveito imediato dessas
coisas não é porque não saiba fazer isso, mas porque sabe o sentido último
delas.
O administrador soube renunciar ao seu benefício imediato
(lucro pessoal a custa dos bens do patrão que ele emprestou) em vista de ser
acolhido pelas pessoas que tinham sido beneficiadas com sua alteração do
recibo. Talvez essas pessoas, quando ele fosse despedido, lhe dessem uma ajuda,
abrissem suas casas para aquele ex-administrador. Por isso, Jesus afirma: “Usai
o dinheiro injusto para fazer amigos, pois quando acabar, eles vos receberão
nas moradas eternas” (Lc 16,9). O dinheiro é chamado injusto seja porque na
origem de toda fortuna existe injustiça – o que sobra para um é porque falta
para outros – seja porque quem o possui o adquiriu mal[3].
É preciso utilizá-lo para fazer amigos, não considerando a riqueza como algo a
possuir mas algo a administrar em vista dos mais necessitado, dos amigos de
Deus que são os pobres. Não se trata tanto de esmola ou de doação, mas de uma
reta administração e restituição.
O pão que para ti sobra é o pão do faminto. A roupa que
guardas mofando é a roupa de quem está nu. Os sapatos que não usas são os
sapatos dos que andam descalços. O dinheiro que escondes é o dinheiro do pobre.
As obras de caridade que não praticas são outras tantas injustiças que cometes.
Quem acumula mais que o necessário pratica crime[4].
Alguns cristãos são muito piedosos, participam das missas
dominicais, fazem suas orações, jejuns... até são dizimistas mas não deixam de
explorar os pobres. Fazem manobras ilícitas para ganhar mais dinheiro, se
aproveitam da administração pública para se enriquecer, estão sempre atentos
para tirar proveito financeiro mesmo que prejudique outros. Isso não acontece
só entre os políticos, industriais e empresários, mas também entre pequenos
comerciantes, funcionários públicos e eleitores que vendem votos. “Não podeis servir
a Deus e ao dinheiro” (Lc 16,13). Jesus pede de nós uma decisão existencial,
colocar Deus no lugar Dele e agir consequentemente.
Pe. Emilio Cesar
Pároco de Guaiuba
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