sábado, 12 de abril de 2014

DOMINGO DE RAMOS - ANO A

Mt 21,1-11
Is 50,4-7
Fl 2,6-11
Mt 26,14 - 27,66

"Ele esvaziou-se a si mesmo" (Fl 2,7)

Quase todas as vezes que ouço o relato da paixão de Nosso Senhor fico esperando algo que não aconteceu: uma intervenção de Deus, um milagre espantoso que calasse a boca e parasse as ações daqueles que crucificaram Jesus, aos moldes dos filmes americanos de ação. No último momento, quando tudo parecesse perdido, o herói apareceria para salvar, vingar os humilhados e reestabelecer a justiça. No fundo, era o que eu desejava que tivesse acontecido. Nada mais humano e compreensivo para quem nutre simpatia por Jesus e seu ideal. Mas isso não aconteceu. Ao contrário, Deus silenciou e deixou que seu Filho fosse entregue, sofresse a paixão e morresse.

Nem mesmo a entrada triunfante e alegre de Jesus em Jerusalém, narrada no primeiro evangelho (Mt 21,1-11),  é capaz de apagar o ranço deixado pela narrativa do sofrimento e morte do Senhor. O próprio Jesus enquanto homem parece que experimentou este silêncio de Deus, Seu abandono: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?” (Mt 27,46). Por que tudo isso? Por que o silêncio e o sofrimento?

Ouvindo a leitura aos Filipenses parece que descobrimos a chave de interpretação de tudo:
Jesus Cristo, existindo em condição divina, não fez do ser igual a Deus uma usurpação, mas ele esvaziou-se a si mesmo, assumindo a condição de escravo e tornando-se igual aos homens. Encontrado com aspecto humano, humilhou-se a si mesmo, fazendo-se obediente até a morte, e morte de cruz (Fl 2,6-8).

Jesus escolheu o caminho do esvaziamento de todas as suas prerrogativas divinas para assumir nossa carne e fazer-se um de nós. Podemos dizer que essa é a forma de Deus ser, seja em si mesmo, seja na sua relação com sua criatura. Deus é amor, e esse amor para se realizar precisa ser relação, troca. Por isso, Deus é Pai, Filho e Espírito Santo. O Pai em seu amor se esvazia inteiramente de si entregando-se ao Filho; que por sua vez devolve totalmente essa doação ao Pai; desta relação amorosa procede o Espírito. Nenhum dos três se retém, nem se impõe ao Outro, eles se doam.

Nas Escrituras também percebemos que a dinâmica da revelação é a do esvaziamento. Para Deus criar o mundo, Ele "saiu" de si e, a partir do seu amor, criou tudo com a Palavra. Ao homem e à mulher manifestou seu plano de amor falando a linguagem deles e não a Sua. A Moisés manifestou-se através daquilo que existe de mais comum e efêmero no deserto, um monte de espinhos pegando fogo. Essa é a forma de Deus ser e agir, o esvaziamento. Não poderia ser diferente com Jesus.

Para Jesus mostrar todo o seu amor pelo Pai e, principalmente, por nós, ele precisava assumir nosso lugar. Não apenas a posição da maioria dos homens, mas aquela dos piores pecadores e criminosos. Ele precisava chegar ao mais baixo da condição humana, ele precisava se colocar até mesmo no lugar dos piores criminosos e experimentar o que significa se condenar para sempre (ser abandonado por Deus). O sofrimento de Jesus, nesta perspectiva, não foi ninguém que impôs sobre ele, mas era uma exigência do seu amor total por nós. Com isso, ele redimiu o homem e a mulher; o pior de todos os criminosos pode receber o perdão e a salvação se aceitar essa doação de amor do Senhor.

Foi por isso que Deus não agiu como os heróis dos filmes americanos, mas deixou que seu Filho nos amasse até o fim; porque no Filho Ele também nos amava (até o fim).


Pe. Emilio Cesar
Pároco de Messejana

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