quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

MISSA DA SANTA MÃE DE DEUS OITAVA DE NATAL


Nm 6,22-27
Gl 4,4-7
Lc 2,16-22

Maria guardava todos esses fatos em seu coração (cf. Lc 2,19).
A Igreja, tanto no oriente quanto no ocidente, sempre teve a alegria de honrar Maria
como Mãe de Deus (em grego: Theotókos). A partir do terceiro concílio ecumênico, o de Éfeso (431), o culto popular prestado à Santíssima Mãe de Deus cresceu em amor, oração e imitação[1]. Na liturgia da Igreja de Roma, esta é a mais antiga celebração dedicada a Maria (550-595d.C.), e foi fixada na oitava do Natal, no dia 1° de janeiro[2]. Pela sua importância para os católicos, é uma festa de preceito (dia santo de guarda).
A maternidade divina está na origem de todo privilégio de Maria. A Virgem concebeu e deu à luz o Verbo de Deus segundo a Carne e, por isso, pode ser chamada de Mãe de Deus. Ela não é mãe apenas do corpo humano de seu filho, mas é a mãe do seu Filho todo, que é Deus[3].
Na segunda leitura ouvimos o anúncio mais antigo deste mistério mariano: "Quando se completou o tempo previsto, Deus enviou o seu Filho, nascido de uma mulher (...)para que todos recebêssemos a filiação adotiva" (Gl 4,4-5). No momento que Jesus, em Maria, se faz filho do homem, nós, filhos dos homens, nos tornamos filhos de Deus. No momento em que ele, de Filho se faz servo, nós que éramos servos nos tornamos filhos. É o admirável intercâmbio entre o céu e a terra que a Igreja ora no seu terceiro Prefácio do Natal: "No momento em que vosso Filho assume nossa fraqueza, a natureza humana recebe uma incomparável dignidade: ao tornar-se ele um de nós, nós nos tornamos eternos". O lugar e a mediadora de todo esse mistério é Maria[4].
O mistério da maternidade da Virgem é algo que precisamos contemplar, professar e reconhecer como grande dom do Amor de Deus por nós. Mas não podemos imitá-lo. O que então a Igreja deseja que façamos a partir do mistério que celebramos?
A resposta está no evangelho. Após a visita e as palavras grandiosas dos pastores à família sagrada sobre o Menino que nasceu, o evangelista escreve: "Quanto a Maria, guardava todos esses fatos e meditava sobre eles em seu coração" (Lc 2,19). Acontecimentos e palavras (rhema) que chegavam ao conhecimento dela eram cuidadosamente depositados no seu coração, na sede de seus pensamentos e decisões; lugar onde o ser humano dialoga consigo mesmo, assume suas responsabilidades e se abre ou se fecha para Deus[5]. Quantas vezes Maria deve ter retornado a "este lugar" para meditar o sentido das palavras dos pastores tirando delas a luz e a força para sua caminhada? Não esqueçamos que a Mãe de Jesus viveu, cresceu e foi provada na sua fé, especialmente durante os 30 anos de silêncio em Nazaré. O principal alimento da sua fé eram as palavras e acontecimentos (rhema) que tinha conservado dentro de si. Por isso, podemos dizer que a Palavra de Deus nela se faz carne duas vezes: fisicamente, durante os 9 meses de gestação; depois espiritualmente, durante o resto da sua vida cada vez que meditava e tentava colocar em prática o que ouvia da parte do Altíssimo, do Filho e do Espírito.
Todos os cristãos precisam imitar Nossa Senhora nesta sua capacidade de ser discípula, escutar a Palavra e por em prática, gerando novamente Jesus na sua vida (cf. Lc 8,21).
A solenidade de hoje, porém, nos questiona também em outro sentido. Qual o lugar da mulher dentro da Igreja? É consenso de que a mulher ainda não tem na comunidade eclesial o lugar que lhe é devido, mas qual seria? Alguns movimentos acreditam que ela precisaria fazer a mesma coisa que os homens podem: ser padre, bispo, papa etc. Será que isso não seria um tipo de machismo ao contrário: só é importante na Igreja aquilo que o homem faz!? Maria não foi apóstola, mas nenhum cristão católico tem coragem de dizer que ele foi menos importante que os doze no plano da salvação e na Igreja. Ela com sua fé, discrição, silêncio e feminilidade conduziu a comunidade dos 120 discípulos para receber o Espírito Santo. Ela é honrada, de fato, como Rainha dos apóstolos. Não foi responsável (epíscopa ou presbítera) por nenhuma comunidade primitiva mas sabemos que ela é a Mãe da Igreja. Será que o lugar da mulher é o mesmo do homem, ou é um outro? Nem maior nem menor, simplesmente diferente, mas tão digno quanto.


Pe. Emilio Cesar
Pároco de Messejana





[1] Cf. Augusto Bergamini, Cristo, Festa da Igreja: história, teologia, espiritualidade e  pastoral do ano litúrgico. 3a Ed., São Paulo: Paulinas, 2004 (Liturgia e participação), p. 448.
[2] Cf. A. Bergamini, Cristo, Festa da Igreja. 3a Ed., São Paulo: Paulinas, 2004, p. 454.
[3] Cf. A. Bergamini, Cristo, Festa da Igreja. 3a Ed., São Paulo: Paulinas, 2004, p. 448. Santo Inácio de Antioquia chama Jesus de "o filho de Deus e de Maria". Tal expressão coloca a Virgem Mãe ao lado do Pai celeste sem fazer dela uma deusa (cf. Cf. Raniero Cantalamessa, La Parola e la vita. Riflessioni sulla Parola di Dio delle Domeniche e delle feste dell’anno A. 12a Ed., Roma: Città Nuova 2004, p. 41).
[4] Cf. A. Bergamini, Cristo, Festa da Igreja. 3a Ed., São Paulo: Paulinas, 2004, p. 42.
[5] Cf. Xavier Léon-Dufour (dir.), Vocabulário de teologia bíblica. 10a Ed., Petrópolis: Vozes, 2009, p. 174-175.

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